Opinion
O interesse da empresa de Mark Zuckerberg pelo metaverse, a razão por detrás da mudança de marca do Facebook para Meta, levanta questões significativas sobre a privacidade de dados na próxima iteração das tecnologias que hoje associamos às redes sociais
Por Henrique Carreiro . 29/11/2021
Apesar das repetidas quebras de privacidade de dados do Facebook ao longo dos anos, Zuckerberg afirmou, durante o anúncio do foco acrescido em tecnologias de metaverse, que a empresa que dirige considerará nesta nova fase uma abordagem mais estrita à privacidade. Embora o metaverse ainda esteja na infância, Meta, como a empresa mãe do Facebook se denomina agora, está a investir muitos milhões de dólares em tecnologias de realidade virtual e aumentada, que irão alimentar o novo universo online, se e quando for desenvolvido. Mas é evidente, até pelo seu modelo de negócio, que o interesse em realidade virtual do Facebook é sobre dados, não sobre jogos ou semelhantes aplicações. As tecnologias de realidade virtual e aumentada serão dos maiores captadores de dados com que nos poderemos debater. E não se trata apenas da captação: o Facebook tem uma das equipas de investigação e desenvolvimento na área da ciência dos dados e da inteligência artificial mais capazes e dotadas de recursos de todo o mundo, equipa que funciona sempre como os dois lados de uma moeda: por um lado, o mundo muito lhes deve no que toca a plataformas atuais de análise e algoritmos. Por outro, muito do que é conhecido agora é apenas o que a equipa fazia há cinco ou dez anos. Daqui a anos, provavelmente olharemos entre maravilhados e siderados ao que fazem hoje. Uma das questões principais que se levantam nesta abordagem do Facebook é o histórico nebuloso da empresa em tudo o que se refere à privacidade dos dados. Desde a fundação, em 2004, tem sido palco de inúmeras quebras de sigilo face àqueles que usam as respetivas plataformas, sendo o mais notório o que se refere à Cambridge Analytica, em 2018, no qual um investigador acedeu indevidamente aos dados dos utilizadores e depois os vendeu a uma empresa de consultoria política. Num acordo com a FCC americana sobre o assunto, o Facebook pagou uma coima de cinco mil milhões de dólares e prometeu melhorar a privacidade dos dados dos utilizadores. Em 2020, pagou mais 550 milhões de dólares para resolver um processo de privacidade envolvendo alegações de que teria violado uma lei do estado de Illinois que exige que as empresas obtenham permissão dos utilizadores para armazenarem os seus dados biométricos, os quais incluem dados que ligam rostos a identidades individuais. Mais recentemente, em abril deste ano, foram divulgados online dados do Facebook que incluíam os nomes completos, localizações, endereços de e-mail, e estado de relacionamento de mais de quinhentos milhões dos seus utilizadores. E no âmbito específico do metaverse, a empresa já está a recolher enormes quantidades de dados de utilizadores através dos seus produtos de realidade virtual, incluindo características físicas das pessoas como uma estimativa do tamanho das suas mãos, os objetos digitais e o áudio que criam em realidade virtual, e informações de terceiros criadores de VR sobre utilizadores. O equivalente a impressões digitais dos utilizadores, por outras palavras. Zuckerberg afirma que a empresa está a trabalhar com especialistas externos para assegurar que os futuros produtos metaverse sejam concebidos “para segurança e privacidade e inclusão”. Mesmo assim, embora os peritos em privacidade possam ter recomendações, tudo o que nos resta é a palavra de Zuckerberg de que a sua empresa irá desenvolver o metaverse dando prioridade à privacidade, segurança, e outros valores considerados importantes para o equilíbrio dos seus utilizadores e das sociedades onde se inserem. Na verdade, é ele que terá a última palavra sobre o que priorizar. Os precedentes dizem- -nos que a privacidade de dados pode não ser a primeira, nem sequer a derradeira, das suas prioridades |